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23 de junho de 2007

The Concept


Há anos o Radiohead lançava o, até hoje maravilhoso e difícil, disco que rachou o conceito sobre música: Kid A. Estranho aos ouvidos e construído em detalhes sinuosos, o álbum perdurou na cabeça de muita gente por anos a fio e muito se debateu acerca do mesmo no seu ano de lançamento (2000). A pergunta daquele ano para qualquer fã de música pop foi: “você ouviu o disco novo do Radiohead”?
Aí você se pergunta o porquê de tanto alarde? E eu respondo: o conceito. Ok! Assimilar a ideologia empregada por Thom Yorke e cia. nunca fora das mais fáceis, mas no disco citado... Digo sem me envergonhar, mas demorei anos para compreender um pouco do universo criado e tão diversificado de Kid A. Se hoje não sou tão “analfabeto” quanto a ele devo dar crédito ainda ao jornalista Simon Reynolds que em ensaio publicado no livro “Beijar o Céu” esmiúça através de entrevistas e declarações pertinentes de sua parte o processo de criação que quase culminou no fim da banda, mas alcançou resultados nunca antes imaginados pela banda.
Introdução feita, venho agora falar do real “objetivo” deste texto: Era Vulgaris, novo álbum do Queens of the Stone Age. Mas, antes de qualquer coisa, é preciso pontuar: não vou traçar comparações entre ambos. Até porque uma única razão me induziu a juntar Radiohead e QOTSA num mesmo texto: o conceito. Mas se em Kid A o Radiohead desenvolveu o seu próprio (novo) conceito que desvencilhou seu próprio universo e se recriou num outro o mesmo não acontece em Era Vulgaris que soa como os quatro discos anteriores. Porém, entender o que se passa na cabeça de Josh Homme é preciso.
Desde os idos de 1998, quando o Kyuss (sua primeira banda) encerrou as atividades, Josh se viu impelido a ir em frente e o resultado disso foi o próprio QOTSA que debutou no mesmo ano. Agora entender o conceito desenvolvido pela “mente doentia musical” de Homme nunca fora algo dos mais fáceis de interpretar.
Herdando a essência pesada e psicodélica de sua ex – banda Josh foi assimilando os mais variados gêneros para construção sonora que hoje é influência para qualquer banda que se preste a tocar “rock” (Muse, Arctic Monkeys, Pitty...) juntando a essência do pop radiofônico (via Kinks), uma veia oscilante entre punk e o metal, guitarras estridentes, espaciais/chapadas (leia – se de riffs repetitivos), vocais quase sempre limpos, bateria marcante, pulsante e animalesca, um número imenso de convidados dos mais variados tipos (que em Era Vulgaris foram: Trent Reznor(NIN), Julian Casablancas(Strokes) e o velho parceiro Mark Lanegan, que comparecem de forma discreta), letras que versam sobre temas alucinógenos (drogas), sexo, confusões inúmeras, dão o tom, de forma resumida, do que Josh é capaz de assimilar, misturar e criar algo único.
E vêm 2007 e Era Vulgaris chega às lojas sendo tachado por alguns como um disco “chato”, “difícil” e, olha a blasfêmia, o “pior disco do QOTSA”. Calma, calma senhoras e senhores. Olha o exagero. O abuso. Contenha – se, por favor. Tal como Kid A, Era Vulgaris não irá lhe conquistar na primeira audição e talvez nem seguintes se você não entender o que volto a frisar: o conceito.
Até para velhos aficionados como eu o disco não “desceu” muito bem nas primeiras audições, mas perseverar é importante e resultado hoje é bem diferente. Tudo o que afirmei acima como parte constituinte do universo stoner (chapado em português) do grupo está lá diluído, salvo a sonoridade punk que, infelizmente, fora levada junto com Nick Oliveri (baixista e co–fundador). Mas isto não interfere.
O começo com a cadenciada “Turning on the Screw” assusta a quem já está habituado ao fato de que, geralmente, discos da banda começam de forma urgente, mas não se engane: a faixa é mais uma daquelas para entrar no seleto hall de “canções clássicas e enigmáticas”. Logo na seqüência a “coisa esquenta” com o primeiro single, a grudenta “Sick Sick Sick”, que muita bandinha nova venderia a alma para tê-la composto. Vêm “I’m Designer” e sua bateria marcante e precisa. “Into the Hollow” é Black Sabbath em câmera lenta. A baladinha “Make It Wit Chu” (oriunda da última Desert Sessions, projeto paralelo de Josh) é incrivelmente deliciosa dada sua melodia marcante e letra engraçadinha. E falando em letra, salvo a última canção citada, o resto do álbum retrata a tal Era Vulgaris, que nada mais é reflexo da nossa, uma geração totalmente confusa, obsessiva, paranóica. Além das 11 ótimas canções que compõem o álbum aos poucos vão pipocando por aí b – sides sensacionais como a singela “Running Joke” e a própria “Era Vulgaris” que, ironicamente, ficou fora do álbum.
Para finalizar, sempre gosto de lembrar da fatídica apresentação do QOTSA no Rock in Rio III no qual o grupo fora vaiado, injustamente, da primeira a última canção pelos fãs que aguardavam ansiosamente o Iron Maiden . Será que hoje isso aconteceria? Duvido. A banda de 2001 (ano do show) não mudou muito quanto à sonoridade hoje, mas tornou – se um “monstro” muito maior, elogiadíssimo e cultuado, lugar talvez nunca imaginado por Josh Homme. E isto faz do grupo uma das melhores bandas dos últimos anos.
Então não deixe se incluir na sua tradicional lista de melhores do ano Era Vulgaris e tente entender o conceito antes de sair falando mal por aí. O diabo mora nos detalhes.

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